terça-feira, 6 de maio de 2008


PROJETO DE LEI Nº 2686, DE 2007
Íntegra da proposta: (do Senhor Deputado Fernando Coruja)

Dispõe sobre a regulamentação de novas profissões.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º A regulamentação de novas profissões somente poderá ocorrer se atendidos os seguintes requisitos, cumulativamente:
I – a atividade deverá ser embasada por conhecimentos teóricos e técnicos reconhecidos;
II – o trabalho a ser reconhecido como nova profissão deverá respeitar a existência prévia e legal de atividades congêneres e sem reserva de mercado, com formação idêntica;
III – previsão da garantia de fiscalização do exercício profissional, conforme
a Lei;
IV – estabelecimento dos deveres e responsabilidades pelo exercício profissional;
V – ser considerada como de interesse social; e
VI – não propor a reserva de mercado para um segmento em detrimento de outras profissões com formação idêntica ou equivalente.
Art. 2º Quando o exercício da nova profissão vier a oferecer riscos de dano social no tocante à saúde, ao bem-estar, à liberdade, à educação, ao patrimônio e à segurança da coletividade ou dos cidadãos individualmente, o projeto que requeira sua regulamentação deverá justificar a sua necessidade e razoabilidade social.
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICATIVA
A regulamentação de profissão é objeto de uma verdadeira enxurrada de projetos de lei apresentados a cada ano no Congresso Nacional, especialmente nesta Casa. Somente neste ano, foram protocoladas dez proposições com o intuito de regulamentar atividades profissionais.
Nos projetos de regulamentação dessas atividades e profissões, em muitos casos, constam atribuições que já fazem parte de leis regulamentadoras de outros ofícios, a exemplo das relativas à Medicina, à Engenharia e à Arquitetura. Assim, pretende-se regulamentar quase todas as profissões existentes sob a alegação de que, sem essa providência, os trabalhadores estão impedidos do exercício de suas atividades. Porém isso está longe de corresponder à realidade em nosso País. Existem inúmeras profissões que, apesar de não regulamentadas, são exercidas de forma eficaz, adequada e a contento e que trazem bastante sucesso aos profissionais. Enquanto outras, mesmo que há muito terem sido
agraciadas pela regulamentação, seus profissionais usufruíram de pouco ou nenhum direito ou benefício previstos na lei regulamentadora, a exemplo da Lei nº 6.242, de 23 de setembro de 1975, que dispõe sobre o exercício das profissões de Guardador e Lavador de veículos automotores. Esses trabalhadores são vulgarmente conhecidos como “flanelinhas”.
Ademais, sob o ponto de vista legal, a exceção de algumas poucas atividades, a maioria pode ser exercida livremente independentemente de qualquer regulamentação, conforme autorização expressa na Constituição Federal. O inciso XIII do art. 5º e parágrafo único do art. 170 do texto constitucional estabelecem o princípio básico da liberdade de exercício de
qualquer atividade profissional ou econômica, desde que lícita.
Diante da profusão de projetos de lei dispondo sobre a regulamentação de profissão, que estava, cada vez mais, opondo os parlamentares às categorias profissionais que se indignavam de não verem seus pleitos atendidos, em setembro de 2001, foi aprovado pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, o Verbete nº 01 da Súmula da CTASP, assinado pelo Presidente, Deputado Freire Júnior. O Verbete dava ao presidente da CTASP o poder de considerar prejudicado um projeto de lei de regulamentação de profissão sem que fosse necessária a apreciação pelo plenário da Comissão, se ele considerasse que, na proposição, não estariam sendo atendidos cumulativamente os seguintes requisitos:
que a atividade exija conhecimentos teóricos e técnicos;
que seja exercida por portadores de diploma de curso reconhecido pelo Ministério da Educação;
que o exercício da profissão possa trazer riscos de dano social no tocante à saúde, ao bem-estar, à liberdade, à educação, ao patrimônio e à segurança da coletividade ou dos cidadãos individualmente;
que não proponha a reserva de mercado para um segmento em detrimento de outras profissões com formação idêntica ou equivalente;
que haja a garantia de fiscalização do exercício profissional;
que estabeleçam os deveres e as responsabilidades pelo exercício profissional;
que a regulamentação seja considerada de interesse social.
A justificação para a adoção do mencionado Verbete, que abaixo reproduzimos, enfatiza, por um lado, a observância aos preceitos constitucionais, e por outro a preocupação com aquelas profissões já devidamente reconhecidas e regulamentadas, destacando a dificuldade de se justificarem novas regulamentações.
“A aprovação de uma Súmula de entendimentos, consolidando as reiteradas decisões desta Comissão, tem o mérito de filtrar e agilizar os trabalhos deste Órgão técnico, promovendo a excelência do processo legislativo. Esse expediente ainda tem a vantagem de dar maior respaldo político e de tornar mais democrática a faculdade regimental que permite ao Presidente de Comissão, de ofício, declarar a prejudicialidade de matéria pendente de deliberação, em virtude de prejulgamento pela Comissão (Art. 62, inciso IX c/c Art. 164, § 1º e inciso II, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados). No caso de regulamentação de profissão, é eloqüente o número de proposições submetidas a este Plenário que, reiteradamente, vêm sendo rejeitadas. Assim, o enunciado proposto para o verbete nº 01/CTASP encontra-se em consonância com as diversas e reiteradas manifestações prolatadas nessas proposições, cujos pareceres podem ser assim sintetizados:
O inciso XIII do Art. 5º e o parágrafo único do Art. 170 do texto constitucional estabelecem o princípio básico da liberdade de exercício de qualquer atividade profissional ou econômica, desde que lícita. Permitir-se que se regulamente os diversos ofícios e ocupações é o mesmo que inviabilizar a norma constitucional.
Significa negar os direitos de cidadania, ao restringir-se ainda mais o acesso ao mercado de trabalho para um enorme contingente de mão-de-obra que porventura não preencha os requisitos impostos pela norma pretendida, mas que, por exemplo, desenvolvam sua ocupação com competência, por mérito pessoal, por habilidade própria ou por um aprendizado que passou de pai para filho etc..
Costuma-se muito confundir regulamentação profissional com o reconhecimento da profissão e com a garantia de direitos quando, na verdade, regulamentar significa impor limites, restringir o livre exercício da atividade profissional, já valorizada, reconhecida e assegurada constitucionalmente. Esse poder do Estado de interferir na atividade para limitar o seu livre exercício só se justifica se o interesse público assim o exigir. E por certo que a exigência do interesse público não é pela especificação ou reserva de direitos para um determinado segmento econômico-profissional e sim pela imposição de deveres em favor da coletividade consumidora de seus serviços que, se praticados por pessoas desprovidas de um mínimo de conhecimentos técnicos e científicos especializados, poderiam acarretar sério dano social, com riscos à segurança, à integridade física, à saúde, à educação, ao patrimônio e ao bem-estar.
Daí por que a regulamentação não pode prescindir de um órgão de natureza, no mínimo, paraestatal, com poderes para exercer licitamente as atribuições normativas e fiscalizadoras do exercício profissional. Mas não há que se confundir a natureza jurídica e as funções finalísticas desses órgãos com as próprias de entidades sindicais e associativas. Conquanto aquelas entidades tenham a prerrogativa de defender a classe, a luta por conquistas trabalhistas compete aos próprios profissionais da área, organizados em associações ou sindicatos, de livre filiação. Nesse caso, não é o interesse da coletividade que predomina e sim o da própria categoria organizada coletivamente.
Por outro lado, as normas tutelares trabalhistas já são aplicáveis quando configurada a relação de emprego, incluindo algumas proteções diferenciadas, tais como o trabalho em mineração, o trabalho de bancários, de telefonistas, em situações como a maternidade, a menoridade etc. Nada disso, no entanto, significa regulamentação profissional. Ao contrário, significa proteção mínima do Estado para determinadas ocupações
desenvolvidas em situação de risco, de penosidade, etc. E se a relação não for de natureza trabalhista, de qualquer forma, são aplicáveis as leis civil e previdenciária ou mesmo a de proteção ao consumidor.
Finalmente, se há interferência de uma atividade em relação à outra, importando restrição à liberdade econômico-profissional, a via adequada para a solução do problema não é a legislativa e sim a judicial.
Dificilmente, portanto, justifica-se a regulamentação de uma profissão, que não sejam as que já estão devidamente regulamentadas. De resto, há que se registrar que o reconhecimento e a dignidade de um trabalho não são conquistados pela via legal, mas decorrem de seu exercício consciente, eficiente e produtivo.”
No entanto, diante da reclamação de vários parlamentares em vista dos pleitos das categorias profissionais interessadas na regulamentação de suas atividades, o Verbete foi revogado no dia 03 de agosto de 2005. E assim, voltou-se ao estágio inicial. Ou seja, não há qualquer parâmetro legal a disciplinar os requisitos para se pleitear a regulamentação de uma profissão conforme os princípios previstos na Constituição Federal.
Além disso, a regulamentação da maioria das profissões por lei, atualmente, mostra-se inadequada em vista do vertiginoso avanço tecnológico verificado em todas as áreas de conhecimento. O processo legislativo, por sua natureza, não consegue acompanhar tais mudanças. Com isso, corrermos o risco de, ao fim de uma longa tramitação legislativa, serem estabelecidas regras que, em pouco tempo, tornar-se-ão obsoletas. Como exemplo, temos as profissões do ramo da informática, cujo desenvolvimento é assustadoramente rápido.
Para isso, existem outros tipos de diplomas legais passíveis de serem freqüentemente modificados, no tempo adequado das mudanças efetuadas, como as normas editadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, que são atualizadas por técnicos sem a necessidade de passar pelo moroso e rígido processo legislativo.
Dessa forma, entendemos que diante da revogação do Verbete, faz-se necessária uma norma que contenha critérios objetivos para que se faça a regulamentação por lei de uma profissão. Em relação às profissões que não se enquadrem nos critérios previstos no
Verbete, os trabalhadores terão seu exercício livremente garantido pelos arts 5º, XIII, e 170, parágrafo único, da Constituição Federal, sendo ainda reconhecidas pela Classificação Brasileira de Ocupações – CBO , elaborada desde 1977, pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE. A última atualização da CBO é de 2002. Essa classificação é o documento normalizador do reconhecimento, da nomeação e da codificação dos títulos e conteúdos das ocupações do mercado de trabalho brasileiro.
A grande vantagem do reconhecimento de profissões por meio da CBO é a sua constante atualização, por uma equipe multidisciplinar do MTE que também leva em consideração as diversas sugestões de aprimoramento que lhe são enviadas. Isso jamais poderia, de forma adequada, se feito por meio do processo legislativo.
Há que se ressaltar, ainda, que, apesar de revogado em agosto de 2005, o Verbete, cujos critérios adotamos no presente Projeto de Lei, continua atual, sob a ótica da orientação normativa e, especialmente para se evitar que, apenas imbuídos pela pressão - legítima que é - exercida por aqueles que desejam a aprovação de novas regulamentações, os membros da Comissão do Trabalho, a quem cabe analisar o mérito da matéria em debate, decidam sem que se analisem com a necessária profundidade todos os aspectos ao tema inerentes.
Pelo exposto, solicito o apoio dos nobres pares, para a aprovação da presente proposição.
Sala das Sessões, de dezembro de 2007.

Dep. Fernando Coruja (PPS/SC)

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